quarta-feira, 1 de junho de 2011

Uma questão de cultura

opinião

Não pretendo que este artigo seja um ato da presente campanha eleitoral, mas tão só um artigo de opinião, expressa enquanto cidadão responsável e interventivo civicamente. Vem isto a propósito da tão badalada extinção ou não do Ministério da Cultura e da forma como este setor da nossa sociedade continua a ser olhado, agora pela classe política, a qual, em grande parte, não se escandaliza com isso.

É verdade que o nosso Ministério da Cultura tem vegetado com orçamentos escassos, que para pouco dão, absorvidos na sua maior parte pela máquina burocrática, pelos grupos instalados ou por decisões erráticas, que deixam pouco ou nenhum espaço de manobra para a definição de uma política cultural para o país. Se Carrilho fez obra, também é verdade que não chegou para a definição de grandes linhas de política cultural com consequências para o futuro. Nos sucessivos governos tem-se assistido à falta de uma estratégia cultural consistente e articulada com outras áreas da governação.

A cultura tem de ser assumida como pilar de um desenvolvimento integral e sustentado do país e das regiões, o que implica uma orientação política clara e com objetivos perfeitamente definidos, com isso optando por uma definição sobre os modelos de gestão a implementar, os meios necessários e os públicos a atingir. A cultura é vista por muitos países como uma opção estratégica onde a política externa no plano cultural tem um valor económico e político de relevo. Vivemos hoje num mundo extremamente competitivo onde a qualificação profissional, a educação e a cultura são investimentos fundamentais. Os portugueses só terão melhores salários e poderão fazer com que o seu nível de vida se aproxime dos padrões europeus se cada um, em conjunto com os poderes públicos, olhar para a cultura como um investimento de médio prazo. É por isso que assinei a petição que, em boa hora, a Sociedade Portuguesa de Autores lançou contra a extinção do Ministério da Cultura. Não é muito difícil explicar a qualquer político que a existência de um Ministério da Cultura tem uma carga simbólica significativa, não é difícil a nossa classe política compreender que um ministro da cultura negoceia com os seus pares de forma mais igualitária que qualquer secretário de estado negoceia com um ministro e também não é difícil de compreender de que há verbas de programas da Comunidade Europeia, de que o Ministério da Cultura beneficia, que não poderão ser usadas por uma secretaria de estado ou que esta não tem a dotação orçamental de um ministério. O díficil está em abandonarmos o populismo de menos ministros e explicar aos cidadãos de que a cultura traz beneficios ao país: no turismo, como no nível de vida de cada um dos portugueses.

É verdade que o mais fácil neste ministério será começar tudo de novo. Mas é uma tentação fácil. Veja-se o que se tem perdido. Exemplo, o Centro Português de Fotografia, que se arrasta num edifício paquidérmico, no Porto, que está longe da sua pujante atividade dos primeiros anos, que já não promove novos valores, a não ser com vulgares exposições. Atividade bem mais meritória em prol dos novos valores da fotografia tem o BES ou a EDP, entidades que não têm a vocação cultural de um Ministério. É verdade que ao Ministério tem faltado também uma relação apaixonada com os cidadãos e, especialmente, destes para com a cultura. É verdade que é preciso introduzir a componente cultural nos programas de governo, algo que ainda não vi, é verdade que é preciso fazer com que os cidadãos gostem de cultura, e é preciso dotar este ministério de meios materiais e humanos. Estamos fartos de museus sem pessoal, com falta de espaço e em edifícios degradados em vez de atrairem novos visitantes. Estamos fartos de ver a Cultura tratada como um adereço em vez de ser um pilar da sociedade. E ainda há quem diga que ela é dispensável porque é transversal a toda a sociedade. Então porque não se extingue a economia, a administração interna ou outros ministérios? No limite, todos eles. Não são também transversais?

António Lopes

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