sábado, 6 de novembro de 2010

Rumo ao Sul: instantes de jazz

Em Angra do Heroísmo, ilha Terceira, pode ser vista a exposição Rumo ao Sul: instantes de jazz, de Carlos Catarecha, patente no Museu de Angra do Heroísmo, até final de Janeiro próximo.

Quando entramos na sale de exposições logo algumas impressões imediatas nos tocam. Em primeiro lugar temos uma apresentação cuidada visualmente, com uma boa distribuição das imagens na sala, com boa iluminação, com uma apresentação gráfica pensada e, finalmente, com imagens de inegável qualidade. Depois, pela localização do Museu e pelo espaço expositivo, respira-se um ambiente de serenidade que funciona como contraponto a imagens de música e de vida, o que nos faz assentar os pés na terra, diria até na sala, e fruir as imagens com redobrado prazer.

A exposição tem ainda alguns pormenores que revelam cuidado na montagem e não o simples encaixar de imagens num espaço. Existe uma fusão entre o espaço e as imagens, existe um ritmo galvanizador no início e no fim, pela sequência de imagens, que esconde algumas imagens e sublinha outras, e pelos espaços usados, estando bem separados os diferentes blocos de imagens, em função da técnica usada ou da abordagem estética. Ao mesmo tempo é bem escolhida a imagem de Ron Carter para destaque, ainda que a sua impressão seja diferenciada em relação ao conjunto, e o wall text é graficamente apelativo, facto que por vezes é esquecido nas exposições. Mesmo as intervenções gráficas ao longo das paredes revelam-se uma boa solução, valorizando o conjunto pelas quebras que introduz e pelo ar de modernidade que transmite. Talvez o único senão seja a legendagem, longe das obras, o que faz perder o seu sentido útil. Uma pequena legenda em substituição do número (um pouco artesanal) não distrai a atenção do visitante, valorizava o momento que a imagem encerra e permitia não andar a correr entre a imagem e a legenda.

As imagens presentes têm o peso de um trabalho documental, pela necessidade de registar um acontecimento e pelo rigor técnico daí decorrente. Por isso não sendo possível uma inovação estética significativa, o autor refugia-se nas opções fotográficas possíveis – o uso da luz, o momento e a execução técnica. O uso da luz é interessante e revelador de um olhar cuidado e de uma prática fotográfica consciente (Nic Thys 2008, Mercedes Sola 2005 ou Roger Mas 2007), auxiliadas por uma adequada iluminação na sala e por uma excelente impressão de cor que soube transpor para o papel uma limpidez na luz que o fotógrafo captou. Se a impressão de cor nos agradou, o mesmo se poderá dizer da impressão de preto e branco.

As imagens apresentadas nesta exposição não deixam de estéticamente poderem ser identificadas com os nossos dias onde, pelos ângulos captados, se afastam de um classissismo que por vezes se encontra em trabalhos deste género (Ignasi Gonzalez 2009). O domínio da técnica tem levado muitos fotógrafos que trabalham este tema a exercícios de radicalismo técnico e de composição formal, comum nas imagens deste género musical nas décadas de setenta e oitenta, mas que ainda hoje podemos encontrar. Por outro lado, também não temos presente qualquer irreverência social, também muito comum na fotografia de jazz nesse período, mas antes o acto de puro prazer fotográfico, onde o autor nos consegue transmitir um momento e uma emoção irrepetível e onde também é visível um momento de êxtase pessoal, misto de prazer do fotógrafo e de admiração deste pelos músicos. Ao mesmo tempo as imagens são objectivas não deixando espaço para objectos supérfluos ou que nos distraiam a atenção, o que demonstra um olhar cuidado.

Carlos Catarecha consegue ainda justificar as suas imagens com um outro elemento presente nas imagens e que é um sentido de timing perfeito. Com o disparo no momento certo consegue-nos transmitir emoções que vão muito para além da fotografia e retratam o estado de alma ou de inspiração dos músicos. Retratam é mesmo a expressão certa quando olhamos para allgumas imagens presentes na sala Dacosta do Museu de Angra (Silvia Perez 2007, Mercedes Sola 2005, Omer Avital 2009 ou Rene Marie 2005). Aliás, no folheto que acompanha a exposição, o autor reconhece isso mesmo ao afirmar que o jazz “(...) resulta de uma interpretação de emoções, às vezes de um modo primário e sanguíneo, outras reflexivo e pensado. Faz sentido, pois, que ambos estejam relacionados.“ Dizemos nós que um fotógrafo que o consiga faz grandes fotografias. É o caso!...

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