quarta-feira, 3 de junho de 2009

Do hotel às hortas


Uma horta no meio da cidade? Porque não? Pode parecer estranho, quando apenas condescendemos num modesto jardim no meio da imensa floresta de prédios. Mas a verdade é que continua a fazer todo o sentido uma horta no meio da cidade, já que constitui um meio de preservação do solo enquanto elemento vivo, é fonte de rendimento, é uma forma de ocupação dos tempos livres, é um espaço de sociabilidade criando laços de vizinhança e de entreajuda e é, ao mesmo tempo, uma forma de humanização do tecido urbano.

Vem isto a propósito da exposição Do hotel às hortas: caminhos de crise e identidade que Ângela Ferreira apresenta do Museu do Neorealismo, em Vila Franca de Xira.  A exposição começa no átrio do Museu com Hotel da Praia Grande, em grande formato, coerente com uma estética moderna que, segundo a apresentação que nos é feita, traduz simultaneamente uma imagem clara e enigmática, reunindo numa só imagem duas encenações originárias de épocas distintas. Na sala do rés-do-chão Ângela Ferreira apresenta-nos as hortas enquanto espaços sobreviventes de uma cultura rural na vida das cidades, espaços não poucas vezes ilegais ou tolerados na ordem do caos citadino, lugares de passagem que o catálogo chama muito acertadamente de não-lugares. O olhar moderno e comprometido da fotógrafa leva-nos a olhar para uma realidade escondida (e humana) das nossas cidades.

A artista, que representou Portugal na Bienal de Veneza, em 2007, coloca-nos com este trabalho perante a questão  do espaço e do tempo, desconstruindo significados que a vida agitada da cidade nos leva a aceitar acríticamente. As imagens, bem impressas e bem distribuídas na sala, fazem-nos pensar. Que melhor objectivo haveria para uma exposição de fotografia, enquanto forma de expressão de um artista?

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