domingo, 21 de junho de 2009

S. Tomé: Máscaras e Mitos


Há algo de perturbador em S. Tomé: Máscaras e Mitos, de Inês Gonçalves, apresentada na galeria Pente 10, até 31 de Julho próximo. Na realidade, fiquei preso ao formalismo provocatório de algumas imagens, assentes na pose para o fotógrafo e no cenário ingénuo, juntos com uma execução técnica irrepreensível e uma boa impressão. Por outro lado, esse mesmo formalismo é fruto de uma paixão pelo projecto e de um envolvimento da fotógrafa com os actores e com os espaços, que se traduz em fotografias muito vividas e muito pessoais, que ultrapassam os retratados, que estão a teatralizar a atitude perante a câmara, para passarmos a visualizar o retrato da própria fotógrafa e o seu estado de alma. O resultado é talvez o trabalho mais bem conseguido de Inês Gonçalves, ressaltando dali uma maturidade estética já longe de Cabo Verde (1999), Odiana (1998) ou Língua Franca (1996). Mais do que por qualquer inovação técnica, essa maturidade é fruto e consequência do rigor técnico, veja-se a iluminação e a impressão de algumas imagens, e do prazer que transborda de algumas fotografias, expresso naqueles magníficos cenários de (todas) as fotografias.

Os retratos aqui apresentados são encenações de pessoas que fazem teatro, com roupa de personagens do teatro, numa fantasia que casa muito bem com a pose para a fotografia. São personagens representadas por grupos de teatro, designados “de tragédia”, misto de felicidade e desamor, protagonizados por bons e maus, por anjos e vilões que, de resto, um vídeo muito interessante ajuda a esclarecer visitante. Num mundo massificado de fotografia onde se reclama a “naturalidade” com laivos de voyorismo, a imagem em pose funciona como uma provocação estética, algo que se adquire com o passar dos anos e que representa uma teatralização dentro do próprio teatro das personagens, dos cenários ou das roupas. Ao mesmo tempo, a combinação do cenário com as personagens e a pose são de uma clareza e de uma ingenuidade formal que nos cativam. Juntemos-lhes a dignidade com que todas as pessoas são representadas e temos razões mais do que suficientes para ir até à Pente 10 ver uma boa exposição de fotografia. Verá que vale a pena!


3 comentários:

  1. Que belas imagens.O olhar do miúdo está um espanto.

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  2. A foto do rapaz está 5*

    Não sabia que já tinhas 4 blogues...

    Isto é uma festa! (risos)

    Adorei :)

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  3. O que mais me impressionou nesta exposição foi a inteligência com que foi feita.

    Trata-se de uma exposição com duas dezenas de fotos, maioritariamente a preto e branco. Uma exposição que num primeiro olhar parece de uma simplicidade atroz. Tão enganadora...

    Achei-a inteligente, no uso de preto e branco em todos os retratos. Elimina, deste modo, factores que poderiam distrair o olhar, como o intenso verde da vegetação, o inevitável retalho de cores das casas da pequena aldeia ou mesmo da indumentária dos fotografados.

    Inteligente na formalidade com que os actores surgem na foto; a sobriedade das suas faces (mesmo que usando uma gravata na cabeça!!) anula qualquer tentativa de interpretação da sua expressão, permitindo-nos focar na sua atitude, expressão corporal e até nalguns detalhes da indumentária.

    Também o uso da cor me pareceu extremamente bem planeado. Quase sempre excluindo a face do actor, serviu para revelar a riqueza do traje, e também como elemento de quebra na sequência dos retratos.

    Finalmente, a simplicidade tão informativa das "legendas" de cada foto. A simples apresentação dos nomes dos actores e das respectivas personagens. Assim, descobrimos que esta é uma tradição inerente a não mais que três ou quatro famílias, uma tradição que passa de geração em geração, uma tradição quase exclusivamente masculina...

    Em resumo, uma história muito bem contada!

    5 estrelas!!! ;) .... Não resisti!!! eheheh

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