sábado, 28 de novembro de 2009

(In) Slow Motion

(In) Slow Motion é a exposição patente no espaço Sousa Valles, em Lisboa, até final de Dezembro. A primeira coisa que me chamou á atenção, quando visitei a exposição, foi a designação de fine art para aquilo que ia ver. Não que esteja habituado a ver por cá fine art, mas porque agora é moda que tudo o que seja “artístico” ou em preto e branco de ser designado de fine art. Em primeiro lugar a fine art pressupõe um patamar estético elevado, aliás o conceito de fine art sublinha a valorização da componente estética, e as escolas usam o termo para remeter o objecto artístico para um certo classissismo. Mas nem toda a imagem impressa a preto e branco é fine art, mesmo que o seja em papel fine art.

Segundo os autores, o projecto pretende recuperar uma “forma lenta de olhar”, o que é conseguido sob o ponto de vista técnico, não tanto sob o ponto de vista estético, onde é necessário concretizar uma atitude perante os espaços que, se nuns casos é conseguido, noutros não tanto. Não deixa de ser positivo, e até bom exemplo para alguns autores, o facto de Armando Cardoso e Elsa Mota Gomes terem partido do conceito para a imagem, no caso pela recuperação de uma forma de olhar e pelos recursos técnicos a que recorreram para concretizar o seu objectivo. As imagens, algumas delas interessantes, perdem-se, porém, num amontoado caótico, apenas ordenado por temas, ainda por cima coladas nas pontas a uma cartolina que ocupa os painéis.

O mais interessante grupo de imagens é constituído pelas paisagens de Elsa Mota Gomes, logo a abrir a exposição. Têm sentimento e transmitem uma sensação de envolvimento da fotógrafa com o objecto fotografado, no entanto falta-lhes dimensão. São claramente imagens que necessitam de uma maior escala (#012, #016 e #027), o que é comum a todas as imagens de Elsa Mota Gomes. Único senão, deslocado do conjunto e mais pobre estéticamente, a praia (#20). Elsa tem um sentir harmonioso da paisagem, que se expressa na luz e na composição primeiro, e posteriormente na impressão (p. ex. #024). Por isso, as situações dos interiores das fábricas não serem tão bem conseguidos, para além de meros exercícios de tecnicismo e ainda que possuam alguma interpretação da luz, caem no clássico (#006 e #011). É talvez altura de Elsa Mota Gomes circunscrever o seu trabalho a áreas mais definidas, e com isso crescer estéticamente, potenciando as suas qualidades e evitando errâncias estéticas. Curiosamente, uma visita ao seu site, neste momento, mostra-nos uma maior unidade no seu trabalho. Por isso também acharmos que a série dos pés e das mãos não nos tráz nada de novo.

Já Armando Cardoso mantêm-se muito clássico e formal (#620 e #601), confirmando o que vimos em anteriores trabalhos. Muito bom a encenar espaços (#568) é desastroso em exteriores (#823 ou #657). Mesmo em interiores terá de fugir de uma fotografia que fez furor nas décadas de setenta e oitenta no seio do movimento amador e que está ainda presente no seu trabalho (e que Elsa também cai em #001). Unica excepção a imagem do Cais das Colunas (#831), fora da linha geral do seu trabalho, onde parece que o fotógrafo se solta das suas amarras estéticas.

Uma última referência para a série das minas, tema onde os trabalhos destes dois fotógrafos estão tão próximos, que as imagens se fundem na abordagem e parecem ser um só autor.

13 comentários:

  1. Meu caro António Lopes

    Obrigado pela visita que fez à nossa exposição.

    Não vou, obviamente, comentar a sua análise aos trabalhos expostos.
    Gostaria contudo de rectificar duas questões abordadas no seu texto, porque podem induzir os leitores em erro:

    Em nenhum dos textos emitidos pelos autores (catálogo, cartazes, “press-release”) é utilizada a expressão “fine art” para designar os trabalhos expostos. O que é dito, isso sim, é que a impressão é jacto de tinta, em papel FineArt, o que são coisas totalmente diferentes.

    Em segundo lugar, e quanto à forma de apresentação, foi expressamente construída uma estrutura, revestida por papel-fundo fotográfico, sendo a colagem das fotos feita com fita “acid free”. É uma opção pouco vista entre nós, mas tão ou mais válida que a clássica colocação em molduras.
    Ou seja, e como disse um crítico seu congénere …". A sala foi preparada para receber esta mostra "sui generis" que pela sua linha dominante pode não agradar a alguns mas é um revelador momento da capacidade de construção de um projecto dos seus autores…”

    Um abraço do velho
    Armando Cardoso

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  2. Confesso que a ideia com que fiquei foi a de que estávamos a observar fine art, para além de ser executada em papel fine art. Se assim não é, as nossas desculpas pela errada interpretação. Quanto aos painéis mantemos a mesma opinião de que prejudica a leitura das imagens sob o ponto de vista estético.

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  3. Vi a sua crítica sobre a exposição no Espaço J.Valles e, não sendo eu uma perita em fotografia, fiquei com uma dúvida quanto ao seu texto, que tomo a liberdade de êxpor.

    Diz que a “forma lenta de olhar” não é conseguida sob o ponto de vista estético, para tal seria necessário concretizar (melhor) uma atitude perante os espaços. Fiquei retida nesta sua frase até porque, e perdoe-me a “crítica à crítica”, o seu texto é difícil de acompanhar sem ter as fotos e a sua numeração (mea culpa, não trouxe o catálogo comigo). Mas como dizia, fiquei retida no que diz ser a necessidade de concretizar uma atitude perante os espaços. É que, sinceramente, foi este para mim o ponto forte da exposição. Vi, senti, espaços (e corpos, que são espaços também eles) que me mostraram uma forma de OS olhar, que me mostraram a forma como os autores OS olharam. Não vi nem precisei de ver o trabalho de 2 pessoas, vi e senti um conceito concretizado. E a partir daqui consegui eu própria fazer a minha apropriação daqueles espaços.

    Dada a sua posição de destaque e reconhecido valor nesta área, ficaria muitíssimo agradecida por ter um desenvolvimento maior sobre a tal deficiente “concretização de uma atitude perante os espaços” . A minha curiosidade prende-se com um projecto pessoal que, sem estar minimamente relacionado com a fotografia, anda precisamente à volta do “olhar longo e lento”.

    Agradeço desde já a atenção que queira dispensar a estes meus comentários.
    Lucia Lima

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  4. Quando refiro que a "forma lenta de olhar" se deve basear na atitude perante os espaços, torna-se necessário reflectir na atitude do fotógrafo perante uma imagem que idealiza ou visualiza. Mais do que recorrer a máquinas ou técnicas que provocam uma sequência de actos lentos, ainda que isso ajude, uma forma lenta de olhar baseia-se muito mais numa atitude contemplativa de olhar e muito menos numa interacção entre o fotógrafo e os objectos ou pessoas que está a fotografar. São duas atitudes distintas que conduzem a duas abordagens igualmente diferenciadas. Nesta última o fotógrafo interage com o que o rodeia, vive, sente, envolve-se com o que o rodeia, transmitindo sentimentos de envolvência e de uma relação biúnivoca entre ele e os objectos. na primeira, muito usada em certos caminhos da fotografia de paisagem, o fotógrafo comporta-se como um elemento exterior, que observa, contempla, os objectos que está a fotografar, não dentro da cena, mas fora dela, observando-a. Esta diferença é fundamental para tornar tudo "mais lento", mais contemplativo. Diríamos que é como contemplar uma paisagem no século XIX, onde a vida era mais calma, ou hoje, onde tudo é mais rápido e mais objectivo. É claro que os recursos técnicos podem ajudar. Ao trabalharmos com câmara de grande ou médio formato estamos a ir nesse sentido devido à morosidade da execução da imagem, por comparação com qualquer compacta ou SLR de pequeno formato. Mais, quando recorremos a um número limitado de imagens possíveis, como no médio formato em filme, temos de escolher, de seleccionar ângulos, logo vemos os espaços não de forma emotiva e interventiva, mas de forma selectiva e racional.No entanto, os resultados serão ainda mais coerentes e conseguidos que aliarmos ao recurso técnico a forma de olhar e de estar num dado lugar. É isso que quero dizer quando falo da atitude perante os espaços.

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  5. Chamar clássico a um fotógrafo que mostra fotos feitas com Toy Cameras? Eu passei por lá, como é meu hábito porque gosto destas coisas, e acabámos por achar que era uma exposição com uma boa dose de experimentalismo, portanto, de risco, o que não me parece de todo estar em consonância com uma postura formal e clássica.

    Sónia Leitão Pereira

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  6. Sem querer entrar em polémicas, ainda que este seja um blog de debate, quando se chama clássico não é nenhum juízo de valor, seja ele bom ou mau. Clássico sim, no olhar, nada tendo a ver com o tipo de material ou recursos técnicos usados. Basta conhecer de História da Fotografia e um pouco dos trabalhos anteriores do fotógrafo (desde os anos 70) e basta ainda ver o tipo de composição que faz para perceber que tem um olhar clássico. Ainda que as máquinas usadas possam revelar um certo experimentalismo técnico e ainda que elas possam influenciar a procura de novos passos estéticos, a verdade é que um fotógrafo varia mais o seu olhar em função das influências do trabalho de outros fotógrafos do que em função do equipamento usado. Mais, o olhar ultrapassa a própria imagem. Poderemos ter imagens mais ou menos manipuladas digitalmente, a cor, e elas continuarem a ter um olhar clássico.

    Por outro lado sublinhe-se que "um olhar clássico" nada tem de prejorativo. Poderá, em alguns casos, significar que se parou no tempo. Mas também poderá significar que se procura aderir a correntes do passado, mas com qualidade. Hoje, Cartier Bresson será um clássico e alguém duvida da sua qualidade? Fotografar paisagem, segundo conceitos de paisagem do século XIX, significa usar um olhar clássico e no entanto isso poderá ser considerado vanguardismo pela provocação estética de usar uma forma de olhar fora do que é comum no nosso tempo. Há fotógrafos que ao procurarem um hiperformalismo entram em caminhos de vanguardismo, veja-se por exemplo alguma fotografia a cor contemporânea.

    Poderá, também como atrás se disse, significar que se parou no tempo e isso deverá fazer cada autor reflectir sobre o seu trabalho, o que também é bom. Bem melhor do que o que acontece com alguns fotógrafos que parando no tempo, só tarde demais reparam que não ficam na História da Fotografia portuguesa. Infelizmente conhecemos muitos, grandes nomes no seu tempo, reconhecidos, que hoje as gerações mais novas desconhecem. Também conhecemos muitos que reflectiram no seu trabalho, juntaram-lhe o experimentalismo e hoje não têm idade.

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  7. Já depois do post anterior fui procurar algumas imagens de Armando Cardoso no seu site (www.armandocardoso.com) e deparei-me com uma imagem ilustrativa do que escrevi. Uma excelente imagem (Sintra #372), que transborda de classicismo no olhar - segundo o autor feita em pin-hole, portanto usando um método experimentalista para os nossos tempos, mas onde o enquadramento por um lado, e a composição por outros (volumes, planos, uso da luz, proporções, juntos com toda a calma que transmite, revelam em tudo um olhar clássico. E no entanto é uma excelente imagem.

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  8. pois eu também passei pelo sousa valles e a propósito do olhar clássico
    aquilo são imagens já muito vistas, como ou sem câmaras de brinquedo.

    é apenas mais uma mostra de imagens, soltas, ainda que agrupadas temáticamente. Não me disse nada de novo.

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  9. Primeira parte

    Já tinha visto a exposição de Elsa Mota Gomes e Armando Cardoso (EMG-AC) quando li a sua crítica. Confesso que fiquei surpreendido. Seria possível que alguém tivesse opiniões tão diferentes das minhas? Fui rever cuidadosamente a exposição. A minha opinião inicial mantém-se e não posso deixar de discordar de muitos aspectos da sua.
    Começo pela questão da fine art, não pela importância que tem, mas pela importância que lhe deu. Na sua crítica os autores são acusados de estar a tentar passar gato por lebre. Na realidade, é o autor da crítica que deturpa os escritos de EMG-AC, insinuando que eles afirmam que se trata de trabalho de fine art, quando se limitaram a dizer “impressos em papel fine art”. A crítica tem mesmo alguma perversidade quando é escrita de modo a deixar subentender que os autores o teriam feito para dar a entender ao visitante que os trabalhos expostos teriam “um patamar estético elevado” e um certo “classicismo” (desculpe mas escreve-se classicismo.
    A crítica continua deturpando as palavras de EMG-AC. Segundo eles o trabalho “...tem a sua génese na ‘forma lenta de olhar’, a que o analógico nos incita e de certa forma nos obriga. O recurso a câmaras hoje já consideradas ‘retro’, a ‘toy cameras’ e a ‘pinholes’ torna-se um elo entre o espaço / tempo e a nossa expressão fotográfica.” Os autores dizem que o tipo de câmaras que utilizam ‘incita e de certa forma nos obriga”, o que é rigorosamente verdade, e não que a forma lenta de olhar é conseguida tecnicamente pelo equipamento utilizado.
    Continua a crítica com apreciações de natureza naturalmente subjectiva sobre as imagens e como são apresentadas “num amontoado caótico”... “ainda por cima coladas nas pontas a uma cartolina que ocupa os painéis”. Trata-se a meu ver de uma forma de exposição original e muitíssimo bem conseguida. O uso de painéis de papel fotográfico preto realça este tipo de fotografias e é muito mais agradável ao olhar do visitante do que as usuais molduras.

    Agradeço a publicação.

    Muitos cumprimentos.


    Henrique Oliveira Pires

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  10. Segunda Parte

    A crítica prossegue expondo, como é natural, as opiniões de quem a faz. Só que o crítico trata o trabalho exposto e os seus autores com uma arrogante sobranceria e isso já não me parece correcto.
    Elsa Mota Gomes é tratada com um altivo paternalismo. Segundo o crítico tem coisas boas mas precisa de “crescer estéticamente” (o erro de ortografia não é meu) e de evitar “errâncias estéticas”. Ora, alguém que conheça o trabalho de EMG sabe que ele é intrinsecamente variado, multifacetado, com objectos, formas e estilos diversos mas onde é sempre reconhecível a autora e as suas formas de olhar. Diversidade não é “errância estética” seja lá isso o que for.
    Armando Cardoso é ainda mais mal tratado. Segundo o crítico, mantém-se”muito clássico e formal”, e sendo, “muito bom a encenar espaços é desastroso em exteriores”... “Mesmo em interiores terá de fugir de uma fotografia que fez furor nas décadas de setenta e oitenta no seio do movimento amador e que está ainda presente no seu trabalho (e que Elsa também cai em #001)” ???. As interrogações são minhas, visto que a frase não tem nexo. Percebe-se ainda que o crítico ordena, determina e manda que os autores fujam e não caiam naquilo que, segundo a sua interpretação, é um tipo de fotografia em que se “cai” logo, onde, “ a estética não é elevada”.
    Trata-se de uma crítica toda feita como se o seu autor se considerasse detentor de uma escala de valores estéticos absolutos e universais: a sua. Em lugar de dar a sua opinião e o seu ponto de vista, guinda-se a um nível em que considera correcto dar uma avaliação de cátedra, utilizando a sua bitola pessoal para qualificar o trabalho exposto, a forma de o expor e mesmo os autores. Considero que se trata de um pretensiosismo inaceitável especialmente quando vem da parte de alguém que, no pequeno texto desta crítica, nos brinda com pelo menos dez erros elementares de português.

    Agradeço a publicação.

    Muitos cumprimentos.


    Henrique Oliveira Pires

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  11. Conheço quem escreve neste blog e sei que tem ajudado muitos fotógrafos a darem os primeiros passos nos circuitos de exposições. Sempre foi assim desde que o conheço. Não faz críticas simpáticas, é verdade, mas é das pessoas que sabe do que está a falar. Só aceita as críticas quem quer e também já assisti a quem não quisesse seguir conselhos. Resultado, nunca passaram dos concursos ou das exposições de esquina.

    José Manuel

    Coimbra

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  12. Fui ver a exposição do meu amigo de muitos anos Armando Cardoso. Gostei...mais de umas que de outras formas...mas gostei; entendi a exposição como uma pesquisa; é a procura. valeu ! A arte é uma forma de expressão felizmente subjectiva e ainda bem.
    Por deformação profissional abordei já muitas e muitas centenas de críticas elaboradas por cérebros volumosos, ao longo de um período cronológico superior a 2.000 anos. É curioso como as ideias chave dos críticos, independentemente da sua latitude, se traduzem por velhas fórmulas mágicas gongoricamente abarrocadas que se repetem ao longo de tão grande período, produzidas por autores aparentemente sem contactos, mas dizendo rigorosamente o mesmo. Algumas destas críticas que li poderiam ter sido escritas por um grego, um romano ou um papa dos tempos passados !
    A colecção e estudo deste tipo de produção literária (refiro-me às críticas, entenda-se)é importante, entre outras coisas, na história das ideias e, claro, nas respectivas correntes filosóficas. Entre muitas outras coisas pode por exemplo perceber-se porque Catão ostestava um figo em pleno senado e porque Salazar prendia os pobres dos comunistas !
    Uma coisa porém muito curiosa tenho sempre encontrado associado às prosas rebuscadas dos mais veementes críticos que quiz o acaso ficassem preservadas até ao presente: Nunca consegui perceber porque esses críticos só conseguiram, durante a sua existência, produzir trechos entrosados de saberes que não existem, por conceitos indefinidos, por tramas incestuosas do verdadeiro conhecimento; porque não terão conseguido deixar para a posteridade verdadeiras obras de arte ?
    É tão simples e despretensioso dizer-se apenas: Gostei Armando ou...não gostei !
    F.E.Rodrigues Ferreira

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  13. Já percebemos que temos aqui um clube de fãs exaltado com o seu mestre. Pois eu já aqui disse que fui ver e não achei nada de novo. Até achei o crítico muito simpático, porque aquilo já há muitos anos que se viu e bem melhor. Para mim poucas imagens se safam. Aliás pararam no tempo, é isso que é o clássico que tanto se fala. Quanto a fotografias coladas, até parece que estamos a falar para papalvos. Tenham dó!

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