quinta-feira, 5 de maio de 2011

TNSC - A Prospectus Archive

exposições crítica

Visitar a exposição TNSC – A Prospectus Archive, de Paulo Catrica, patente no Museu da Eletricidade até ao próximo dia 22 de maio, constitui não apenas uma visita a uma excelente exposição de fotografia, mas igualmente entrar no mundo íntimo do fotógrafo, desvendando-lhe segredos e paixões. Na realidade esta exposição é muito mais do que um conjunto de fotografias, é principalmente, uma seleção de espaços arquitetónicos que Paula Catrica escolheu com base numa paixão por esses espaços. Esssa seleção, coloca o fotógrafo no papel de interlocutor com o público, de guia do visitante pelos recantos de um velho teatro do século XIX.

Marcante na vida cultural, social e política dos séculos XIX e XX lisboetas e portugueses, o S. Carlos guarda um conjunto de memórias que o fotógrafo soube registar, respeitando a luz existente, não se comportando como um intruso, mas antes como fazendo parte do espaço, compreendendo-o, respeitando-o e sentindo-se fascinado por ele. É esse fascínio, juntamente com a luz, que traduz um ambiente de mistério, de silêncio, de solidão, por contraponto àquilo que imaginamos num teatro deste género – música, aplausos, o som da voz protagonista. É esta ausência de som, que se “vê” nas imagens, que nos leva a olhar para as imagens com redobrada atenção. A forma descritiva e realista das imagens levam-nos a vivenciarmos os locais, como se fosse possivel estarmos lá, em frente daqueles objetos, olhando para aqueles recantos, conhecer aquelas sombras. E são imagens que conjugam o documento com a modernidade do olhar, muito marcado pela fotografia contemporânea, reflexo do que se faz hoje fora das nossas fronteiras.

São imagens de um formalismo quase provocatório derivado de um rigor técnico de referência, fruto de influências do percurso fotográfico de Paulo Catrica. Refira-se que depois de estudar em Lisboa, no Ar.Co., nos idos anos oitenta e de rumar ao Goldsmiths College de Londres, foi bolseiro da Fundação da Ciência e Tecnologia e fez formação na Universidade de Westminster, em Londres. O trabalho de Paulo Catrica, realizado entre 205 e 2009, centra-se muito nos espaços citadinos, por vezes vazios, dando particular ênfase à arquitetura desses espaços, de uma forma descritiva e muito sentida.

A exposição é aberta por um excelente texto de João Pinharanda, que deveria ser motivo de reflexão para todos os fotógrafos que se apresentam publicamente numa exposição – “(...) porém a derradeira narrativa é a que estrutura o próprio trabalho apresentado. É ela que inventa para nós aquilo que deveremos ver. (...)”. Por outras palavras, a importância da reflexão sobre as imagens do projeto, a sua seleção e a sua ordenação numa sala. Como também diz João Pinharanda “(...) é certo que toda a memória é construída e que toda a construção é invenção (...)”, mas aqui é também a capacidade de sentir os espaços, de os inventar e de construir uma memória, que está na base da criatividade artística. Paulo Catrica não se limita a registar recantos pelo exotismo da luz ou dos objetos, fotografa esses espaços com base na sua paixão por eles, e por isso eles nos surgem tão naturais. Em entrevista ao Ípsilon Paulo catrica afirma que “nos últimos anos já ninguém dava por mim”, o que é visível nas imagens apresentadas. Só assim também se explica que o fotógrafo após ter terminado formalmente o seu trabalho, continuasse a deambular por aquele espaço e a registar novos e renovados momentos.

De registar o material de apoio à exposição, que é não só informativo como formativo. Nas imagens expostas, realce para uma escala bem escolhida na ampliação fotográfica, pecando esta por poder ser mais límpida e com isso valorizar a força das imagens. A única exceção, talvez fosse a do palco do S. Carlos que deveria ser extraordinário numa escala maior. Claramente esta é uma exposição que vale a pena ver,... e sentir.

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